Classificar uma mercadoria no código NCM correto vai muito além de preencher um campo na nota fiscal: é o ponto de partida para definir alíquotas de II, IPI, PIS/COFINS e ICMS, enquadrar regimes especiais, liberar cargas na aduana e evitar multas por classificação incorreta que podem chegar a 1% do valor aduaneiro – sem falar em autuações estaduais e bloqueios de cadastro.
Em outras palavras, classificação fiscal de mercadorias é o DNA tributário do produto. Se o código estiver errado:
- A empresa recolhe impostos a maior (perde competitividade) ou a menor (gera passivo e riscos de fiscalização).
- O crédito de PIS/COFINS ou ICMS pode ser glosado, afetando o fluxo de caixa.
- Na importação, o despacho aduaneiro atrasa, somando custos de armazenagem e demurrage.
Por isso, dominar o passo a passo de enquadrar produtos na Nomenclatura Comum do Mercosul (NCM) – aplicando as Regras Gerais de Interpretação (RGI) e consultando fontes oficiais – é obrigação estratégica de contadores, analistas fiscais e profissionais de comércio exterior.
Nos próximos blocos, você verá:
- Como a NCM se relaciona com o HS Code internacional.
- O uso correto das RGIs e dos Ex-tarifários.
- Os impactos diretos na tributação e nas penalidades.
- Ferramentas práticas para agilizar suas consultas e blindar suas operações.
Vamos começar entendendo a estrutura da NCM e por que ela é a espinha dorsal da classificação fiscal.
- Entendendo a NCM e o HS Code
- Por que isso importa?
- Regras Gerais de Interpretação (RGI): o GPS da classificação
- Passo a passo com RGI
- Ex-tarifário: quando a exceção reduz o imposto de importação
- Quando solicitar Ex-tarifário?
- Erros comuns e multas na classificação fiscal de mercadorias
- Impacto tributário do NCM correto
- Checklist rápido para não errar a classificação fiscal
- Conclusão: classificação fiscal é critério de sobrevivência
- FAQ – Classificação fiscal de mercadorias: perguntas frequentes
Entendendo a NCM e o HS Code
A Nomenclatura Comum do Mercosul (NCM) é o código de 8 dígitos adotado no Brasil, Argentina, Paraguai e Uruguai para identificar mercadorias. Ela deriva diretamente do Harmonized System (HS), padronização internacional administrada pela WCO (World Customs Organization).
HS (6 dígitos) + Desdobramento Mercosul (2 dígitos)
Dígitos | Significado | Exemplo (8504.40.40) |
---|---|---|
1–2 | Capítulo | 85 → Máquinas, aparelhos elétricos |
3–4 | Posição | 04 → Transformadores, conversores |
5–6 | Subposição | 40 → Conversores estáticos |
7–8 | Item/Ex. NCM | 40 → Fonte de alimentação (chaveada) |
Importante: os seis primeiros dígitos são iguais no mundo todo; os dois últimos variam dentro do Mercosul para detalhar ainda mais o produto.

Por que isso importa?
- Tributação: cada NCM tem alíquotas específicas de II, IPI, PIS/COFINS, ICMS e pode ter benefícios como redução de base de cálculo ou isenção.
- Regimes especiais: programas como Drawback, Repetro ou Ex-tarifário dependem da correta identificação do código para concessão.
- Comércio exterior: o erro de NCM gera retenção de carga, exigência de LI retroativa ou reclassificação com multa.
Dica prática: comece sempre pela descrição comercial do produto > verifique o capítulo e a posição no HS 2022 > refine até o item NCM consultando notas explicativas e o TEC (Tarifa Externa Comum).
Regras Gerais de Interpretação (RGI): o GPS da classificação
A Receita Federal adota as RGIs 1 a 6 (iguais às do HS) para guiar a escolha do código NCM quando a descrição do produto não é óbvia. Seguir essa ordem evita autuações por “interpretação livre”.
RGI | Aplicação prática | Exemplo resumido |
---|---|---|
RGI 1 | Título e Notas de Capítulo/Posição prevalecem. | Capítulo 64 abrange apenas calçados; bolsas (Cap. 42) não entram. |
RGI 2(a) | Produtos inacabados ou desmontados classificam-se como completos, se apresentarem características essenciais. | Bicicleta enviada em kit de montagem classifica como bicicleta pronta. |
RGI 2(b) | Misturas ou combinações de materiais seguem regras 3 ou 4. | Tecido misto algodão/poliéster. |
RGI 3(a) | Posição mais específica prevalece sobre a genérica. | “Chocolate recheado” → posição do chocolate (genérica) × posição do produto com recheio (específica). |
RGI 3(b) | Composições classificam-se pelo material ou componente que lhes confere caráter essencial. | Conjunto mesa (metal) + tampo (vidro) ⇒ caracteriza-se pelo metal. |
RGI 3(c) | Se ainda houver dúvida, vai para a posição de número mais alto. | Critério residual. |
RGI 4 | Mercadoria não descrita → posição análoga. | Peça nova de tecnologia ainda sem posição própria. |
RGI 5 | Embalagens especiais classificam-se com o produto. | Estojo de óculos de luxo vendido junto. |
RGI 6 | Seleção do subitem (7º e 8º dígitos) segue notas de subposição. | 8504.40.40 × 8504.40.90 (fonte vs. outros). |
Passo a passo com RGI
- Leia a Nota Legal do capítulo e posição.
- Aplique RGI 1: a descrição cabe 100 %? Se sim, classifique.
- Produto incompleto? Use RGI 2(a).
- Misturas ou kits? Siga RGI 3 e decida pelo caráter essencial.
- Nada se encaixou? Recorra às RGIs 4–6 em ordem.
Ferramenta útil: planilhas de classificação ou softwares que já embutem as RGIs facilitam o trabalho, mas o profissional precisa entender a lógica para defender o enquadramento diante da fiscalização.
Ex-tarifário: quando a exceção reduz o imposto de importação
O Ex-tarifário é um regime que permite reduzir temporariamente a alíquota de Imposto de Importação (II) para bens de capital (BK), bens de informática e telecomunicações (BIT) que não tenham similar nacional. Essa exceção aparece como um “Ex” (de exceção) depois do código NCM¹.
Exemplo real
NCM 8479.89.99 – “Outras máquinas e aparelhos mecânicos”:
- Alíquota TEC padrão: 14 %
- Com Ex-tarifário Ex 002: 0 %
Quando solicitar Ex-tarifário?
- Produto sem similar nacional – precisa de laudo de inexistência emitido por entidade setorial.
- Investimento produtivo – máquina ou equipamento para ampliar ou modernizar capacidade.
- Projeto detalhado – apresentado ao MDIC, justificando ganhos de produtividade e inovação.
Vantagens
- Redução de custo de importação (II e, muitas vezes, reflexo no IPI).
- Melhora do fluxo de caixa em projetos de grande porte.
- Competitividade: menor custo unitário do bem e depreciação.
Pontos de atenção
- Prazo de vigência: normalmente 2 anos; após isso, deve-se reaplicar ou pagar a alíquota cheia.
- Classificação correta: se o “Ex” for aplicado ao NCM errado, o benefício pode ser cancelado e o imposto, cobrado retroativamente com multa.
Dica prática: ao identificar um BK/BIT no cadastro, verifique se existe Ex-tarifário vigente na Resolução Gecex correspondente ao NCM. Ferramentas de consulta NCM com módulo Ex-tarifário agilizam essa checagem.
Erros comuns e multas na classificação fiscal de mercadorias
A Receita Federal e as Secretarias de Fazenda estaduais aplicam penalidades severas para NCM incorreto:
Situação | Penalidade típica |
---|---|
Importação – erro no DI | Multa de 1 % do valor aduaneiro (mín. R$ 500) + diferença de tributos |
NF-e com NCM errado | Auto de infração estadual (multa até 10 UFs por documento) |
Crédito de ICMS/PIS/COFINS glosado | Estorno do crédito + juros Selic desde a apropriação |
Recolhimento a menor de IPI/II | Diferença do imposto + multa de ofício (75 % a 150 %) |
Exemplos clássicos de erro:
- Utilizar NCM genérico “outras” sem análise das RGIs.
- Classificar kit como peça individual (ou vice-versa).
- Não atualizar NCM quando a TEC é revisada (mudança de capítulo ou criação de subitem).
Impacto tributário do NCM correto
Cada código define alíquotas distintas de:
- II e eventuais regimes (Drawback, Repetro).
- IPI (imposto seletivo que varia de 0 % a 300 %).
- PIS/COFINS – regimes cumulativo x não cumulativo, créditos diferenciados.
- ICMS e benefícios (redução de base, crédito presumido).
Um único dígito de diferença pode alterar a carga total em dois ou três pontos percentuais, comprometendo margens e competitividade.
Checklist rápido para não errar a classificação fiscal
- Descrição comercial completa (composição, uso, função).
- Aplicar RGI 1-6 até chegar ao subitem.
- Validar nas Notas Explicativas e legislação correlata.
- Verificar alíquotas e benefícios (Ex-tarifário, reduções).
- Registrar laudo técnico quando aplicável (BK/BIT, similaridade).
- Atualizar NCM no ERP/NF-e e treinar equipe periodicamente.
Conclusão: classificação fiscal é critério de sobrevivência
A classificação fiscal de mercadorias é o DNA tributário do produto: define imposto, crédito e desembaraço. Erros custam caro, enquanto a correta aplicação das RGIs, o aproveitamento de Ex-tarifário e o uso de ferramentas de consulta garantem compliance, economia e competitividade.
Quer automatizar a revisão de NCM nos seus cadastros e NF-e? Conheça as soluções da e-Auditoria que cruzam notas, SPED e legislação para blindar sua operação contra autuações.
FAQ – Classificação fiscal de mercadorias: perguntas frequentes
Classificação fiscal é o enquadramento da mercadoria na Nomenclatura Comum do Mercosul (NCM), código de 8 dígitos que deriva do HS internacional. Esse código define alíquotas de II, IPI, PIS/ COFINS, ICMS, liberações aduaneiras e regimes especiais; um dígito errado gera imposto maior, passivo fiscal ou retenção de carga.
Siga este roteiro:
1. Descreva tecnicamente o produto (composição, uso, função).
2. Localize capítulo e posição no HS 2022.
3. Aplique as Regras Gerais de Interpretação (RGI 1-6) até o subitem.
4. Consulte Notas Explicativas, TEC e possíveis Ex-tarifários.
Ferramentas que integram essas fontes agilizam o processo e reduzem erros.
As RGIs são seis regras sequenciais que orientam a escolha do código NCM quando a descrição não é óbvia. Exemplos:
RGI 1: título e notas do capítulo prevalecem;
RGI 2(a): produto inacabado classifica-se como completo;
RGI 3(b): em kits, vale o componente que dá caráter essencial.
Seguir a ordem evita autuações por interpretação subjetiva.
É uma exceção que reduz, temporariamente, a alíquota do Imposto de Importação para bens de capital e de informática/telecom sem similar nacional. Consta como “Ex” depois do NCM (ex.: 8479.89.99 Ex 002) e exige pedido formal ao MDIC. Se aplicado ao NCM errado, o benefício é cancelado e o imposto cobrado com multa.
Importação: multa de 1 % do valor aduaneiro (mín. R$ 500) + diferença de tributos.
NF-e interna: autuação estadual e glosa de créditos de ICMS/PIS/COFINS.
Recolhimento menor de IPI/II: imposto devido + multa de ofício (75 % a 150 %).
Manter cadastros atualizados, aplicar as RGIs e usar softwares de validação são as melhores defesas contra esses riscos.