Criação de novo imposto digital esbarra na pouca aceitação do Congresso
Os líderes do governo no Congresso têm uma missão difícil pela frente: convencer os pares em relação à criação de um novo imposto de transações digitais, nos moldes da CPMF.
O ministro Paulo Guedes defende sua implementação como uma necessidade para fazer frente às demandas orçamentárias, e tem sinal verde de Bolsonaro para testar a receptividade do tributo, mas a ideia ainda não conta com aceitação no Congresso.
A estratégia do governo, segundo líderes ouvidos pelo JOTA, é apoiar o avanço da PEC 45/2019(Reforma Tributária) na Comissão Mista. “Isso não significaria respaldo à nova CPMF, mas apenas uma sinalização de que não haveria interdição da pauta”, disse uma fonte ligada ao presidente Rodrigo Maia, contrário à criação de um novo tributo.
Rodrigo Maia é defensor de primeira hora da PEC 45 e montou uma comissão para avaliá-la, colocando aliados em posições chave. Além disso, o autor do texto, deputado Baleia Rossi (MDB-SP), é um dos potenciais candidatos de Maia à sucessão na Câmara. É diante desse aspecto que o governo pensa em apoiá-la para ter mais chances de sucesso na Câmara.
Comissão Mista
No entanto, membros da comissão mista da reforma tributária avaliam, em sua maioria, que a medida não vingará. Isso porque o governo demorou a se organizar para discutir o tema com a Casa.
Um importante emedebista integrante da comissão avalia que o governo cometeu um “erro de principiante” ao levar o assunto à imprensa antes de testá-lo no Congresso — e agora pagará o preço. “Barros está conversando com líderes para convencer. Isso devia ter sido feito desde o começo. Antes de ir para o jornal. Na política, tem que sondar [primeiro] quem aprova na Câmara e no Senado”, disse.
Esse mesmo parlamentar também lembrou que, além de trabalhar para apagar o passado impopular da CPMF, o governo terá de explicar, para aprovar a medida, a viabilidade técnica e fiscal que permita compensar a arrecadação da nova CPMF com a desoneração da folha de pagamento. “Eu não vejo espaço para aprovar CPMF aqui hoje. Mas também não digo que não passa. Vai depender da articulação”, disse.
Outros integrantes do colegiado também avaliaram que a linha de frente montada para emplacar o novo tributo foi montada de olho em dois fatores: o calendário apertado de 2020 e, principalmente, o afastamento forçado do presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), para se tratar da Covid-19. Maia é um dos principais adversários do novo imposto, que se torna, agora, a medida prioritária da equipe econômica do governo.
Um deputado — veterano no Congresso — disse que a nova liderança do governo na Câmara sabe do prazo apertado para aprovação da medida e que por isso aproveitou o vácuo deixado pelo afastamento de Maia para tratar a Covid-19 para não perder tempo na articulação.
“A partir do final do ano, a maioria dos deputados só pensará na reeleição [de seus mandatos]. As grandes reformas tinham que acontecer esse ano. Ano que vem não tem perdão”, disse esse deputado, referindo-se a reformas impopulares que acontecem próximas a anos eleitorais.
O membro do PT na comissão, Afonso Florence (BA), reconheceu a imagem negativa da CPMF, que foi apoiada pela sigla no passado, mas disse que o partido não aceita discutir o novo tributo para financiar a desoneração da folha de pagamentos de grandes empresas. De acordo com Florence, antes, o PT apoiou a contribuição para financiar a Saúde e a Educação.
Já outro deputado, do PSD, ouvido pelo JOTA disse que é natural que os parlamentares se entrincheirem diante da criação de uma nova e impopular CPMF, já que ninguém quer ficar marcado por ter ajudado a aumentar a carga tributária. Entretanto, ele avalia que, se o governo achar uma narrativa sustentável para implementação da medida, há grandes chances de o imposto ser emplacado, pois “há fundamento” para sua implementação.
“Tem receptividade, sim. Esse assunto vai e volta. Estão tentando ajustar. Não é nenhuma novidade. Isso já estava na pauta algumas vezes e o governo está buscando uma lógica de distribuição [da arrecadação]”, disse este deputado.
O senador Reguffe (Podemos-DF), também membro do colegiado, não vê sentido na criação do tributo: “Sou contra [imposto sobre transações digitais], seja com esse nome ou qualquer outro que queiram inventar. O Brasil não precisa de mais impostos, precisa cortar impostos e ser mais criterioso e eficiente nos seus gastos”.
Fora da comissão
O JOTA também ouviu parlamentares que não fazem parte da comissão mista da reforma tributária.
A deputada Margarete Coelho (PP-PI), por enquanto, não tem um posicionamento sobre o tema. “A princípio eu não sou nem a favor nem contra. Preciso saber de que forma esse imposto vem, como é que ele vai ser cobrado, quais vão ser as fontes geradoras para que eu possa me posicionar”, disse.
Para a oposição, não faz sentido taxar a classe média sem recorrer a outras formas de ampliar a arrecadação. “Fazer com que a classe média pague mais impostos, nós não aceitaremos. O Brasil já tem uma carga tributária muito alta”, destacou o deputado José Guimarães (PT-CE). “Vamos taxar as grandes fortunas, as grandes heranças e os lucros e dividendos. Se fizermos essas três coisas, já arrecadaríamos recursos de sobra para o Mais Bolsa Família”, completou.
A líder do PCdoB na Câmara, deputada Perpétua Almeida (AC), destacou que um tributo nos moldes da antiga CPMF tem efeitos principalmente sobre os mais pobres. “Todo imposto sobre consumo atinge os mais pobres ou os que ganham menos. A CPMF é um imposto regressivo em cascata, sendo assim, o efeito sob os mais pobres é muito mais pesado”, disse. “Portanto somos contra a criação de novo imposto como quer o governo ao criar a CPMF”.
A deputada também entende que não faz sentido criar o novo tributo como condição para a manutenção na desoneração da folha de pagamento de alguns setores. “Não somos contra desonerar a folha, porque desoneração traz melhorias nas condições de emprego. Mas em lugar nenhum do mundo se resolve o desemprego apenas desonerando a folha”, ponderou. “Isso por si só pode até engordar a conta de empresas. Para gerar empregos é preciso melhorar a economia. E não se melhora a economia aumentando imposto”.
*Fonte: jota.info