Crédito no regime monofásico, a nova CBS e o STJ
A concessão de créditos a descontar das contribuições devidas é a técnica de que se valeu o legislador para evitar a incidência cumulativa das contribuições ao PIS e à Cofins nas cadeias produtivas. Tal afirmação resulta na conclusão de que a concessão dos créditos pressupõe incidência em cascata no processo produtivo, caso contrário os créditos não serviriam a evitar a cumulatividade, mas sim a desonerar a cadeia produtiva por meio doutra técnica, qual, a concessão de crédito presumido.
Com base nesse raciocínio, o legislador tributário entendeu, num primeiro momento, que o regime não-cumulativo da PIS (e também da Cofins) seria incompatível com a incidência monofásica das contribuições, tendo assim justificado a exclusão dos setores submetidos à incidência única na exposição de motivos da MP 66/02.
Mas o pensamento evoluiu e a partir de maio de 2004, por força da Lei 10.865/04, a incompatibilidade ruiu, passando a ser admitida a convivência do regime não-cumulativo com a tributação concentrada às empresas que apuram o IRPJ pela sistemática do lucro real, ressalvadas as exceções legais.
Com efeito, não é necessariamente porque uma empresa comercializa produtos submetidos à incidência monofásica que deixaria de haver cumulatividade das contribuições sobre suas receitas. P. ex.; uma farmácia que além de auferir receitas com a venda de medicamentos e cosméticos (produtos na monofasia), vende produtos típicos de loja de conveniência (chicletes, salgados e chocolates).
Não admitir crédito na aquisição destes últimos bens para revenda implicaria cumulatividade das contribuições. Ademais, também se descontam créditos em relação a insumos (embalagens, p. ex.), energia elétrica, aluguéis de prédios e máquinas, etc.
Daí que, em plena consonância com a lógica não-cumulativa, o legislador passou a vedar, via de regra, apenas a apuração de créditos em relação à aquisição para revenda de bens submetidos à incidência monofásica, posto que a incidência única é ontologicamente contrária à cumulatividade.
Nessa mesma linha, o novo projeto de Lei vocacionado à instituição da CBS, em substituição ao PIS e a Cofins, permite a apropriação de créditos vinculados às receitas de revenda dos produtos submetidos à sistemática monofásica (que ficou restrita a pouquíssimas cadeias de produção), exceto em relação aos próprios bens adquiridos com tributação concentrada, (arts. 11, 37 e 38).
Ainda em 2004, adveio a Lei do Reporto, que estabeleceu, em seu artigo 17, que as vendas efetuadas com suspensão, isenção, alíquota zero, ou não incidência da Contribuição para o PIS/PASEP e da Cofins, não impediriam a manutenção, pelo vendedor, dos créditos vinculados a essas operações.
À toda evidência, o objetivo da norma foi evitar a anulação econômica do benefício fiscal, o que ocorreria caso fosse obrigatório o estorno de créditos legitimamente obtidos.
Isso não significa, entretanto, que foram revogadas as vedações legais ao nascedouro do crédito (art. 3º, §2º, inc. II das Leis 10.637/02 e 10.833/03). Com efeito, uma coisa é vedar o surgimento do crédito e outra é autorizar sua manutenção: esta hipótese pressupõe a ocorrência daquela.
A tributação monofásica se presta à eficiência arrecadatória nas cadeias pulverizadas e consiste na incidência de alíquota maior na primeira fase da cadeia produtiva, aplicando-se alíquota zero (ou isenção) nas operações seguintes, do que resulta a ausência de cumulatividade.
Essa sistemática aplica-se, p.ex., aos combustíveis, fármacos, cosméticos, veículos, máquinas, autopeças, pneus e bebidas frias, estas até vigência da Lei 13.097/15. Na nova CBS, basicamente aos combustíveis e aos cigarros.
Autorizar o creditamento pelos revendedores implicaria tributação negativa de PIS e Cofins e equivaleria a conceder um crédito prêmio, ao arrepio da vedação legal explícita e com violação frontal dos artigos 111 do Código Tributário Nacional e 150, § 6º, da Constituição Federal, a setores econômicos relevantes, responsáveis por boa parte da arrecadação federal.
Portanto, a pretensão de se creditar do custo dos bens sujeitos à incidência monofásica para revenda deve ser repudiada. Vale lembrar que a instituição da não cumulatividade do PIS e da Cofins (tal qual sua unificação na CBS) jamais teve viés desoneratório. A neutralidade fiscal foi uma das premissas da nova sistemática de arrecadação.
Quando pretendeu excepcionar a exceção, ou seja, autorizar a tomada de créditos quanto aos custos vedados na alínea b do inc. I, do art. 3º dos diplomas de regência, o legislador o fez expressamente.
Foi o que ocorreu em relação aos fabricantes e importadores que vendem produtos submetidos à monofasia diretamente ao consumidor final, conforme § 2º, do art. 24 da Lei 11.727/08. Neste ponto, a proposta da CBS também é simétrica (art. 36).
A controvérsia parece simples e se resolve pelo princípio da especialidade, mas tem gerado polêmica no âmbito do Superior Tribunal de Justiça. Acredita-se que, tão logo retomadas as sessões presenciais na Corte da Cidadania, haja vista a oposição expressa dos contribuintes à continuidade do julgamento dos ERESPs. 1.109.354/SP e 1.768.224/RS sob a sistemática virtual, os jurisdicionados, incluindo a União, serão brindados com a necessária e almejada segurança jurídica.
*Fonte: jota.info